A arte e a cultura, nas suas múltiplas vertentes, refletem o seu tempo. Estas expressam a forma como entendemos o mundo e nos situamos nele. Mas vão além disso, detendo um papel fulcral na forma como imaginamos novas realidades, utopias e revoluções. Ao longo da história, são vários os exemplos de movimentos artísticos e de artistas que criaram articulações entre a produção estética, o combate político e a mudança social. A dimensão da criatividade, da intervenção e da arte, enquanto campos de expressão social e política, são cada vez mais focos de pensamento crítico, de resistência, de antagonismo e de alternativa, face ao sistema político tradicional e àquilo que este representa. Por isso mesmo, quando associamos as artes e a cultura às utopias torna-se possível vislumbrar alternativas vivenciais desejáveis e desejadas.
A atualidade é um período particularmente crítico em que as artes podem adquirir um papel central. Vivemos tempos em que os extremismos e os populismos se expandem e no qual o sistema político é alvo de uma desconfiança generalizada. São vários os/as autores/as que nos referem os riscos desta modernidade tardia e suas distopias. Paralelamente, vivemos tempos de colapso dos ecossistemas e de questionamento de uma velha ordem económica: o que ocasiona fraturas sociais e ecológicas profundas, algo que tem vindo a ser retratado no antropoceno: a sexta extinção. Neste contexto crítico, surgem novas vozes, mas também novas gramáticas de ação política, tecnológica, ambiental e espiritual, que se movem em torno de causas tão diversas como os direitos humanos, a igualdade de género, o combate ao racismo, a crise ambiental, entre outros. Em diferentes contextos geográficos, sociais e culturais, verificámos um crescente dinamismo proveniente de sectores sociais minoritários, alternativos, subalternizados ou estigmatizados, que promove uma crescente visibilização e participação na esfera pública. A música, a literatura, a street art, a performance, o corpo, a fotografia, as artes plásticas ou as artes digitais são, entre muitos outros, recursos e linguagens usados criativamente para a participação cidadã.
Entrelaçar arte e ativismo institui-se, assim, como uma expressão indelével da cidadania e da participação na esfera pública, não só pela genuinidade da criação e do ato artístico, como também pela capacidade de trazer para a agenda pública novas questões, criando discursos renovados no campo político, possibilitando, concomitantemente, o desenho de utopias, novas vias de saída para a crise e futuros de esperança.
A terceira edição da conferência COMbART visa, precisamente, amplificar e dar continuidade às reflexões que têm sido desenvolvidas desde as anteriores edições, fomentando discussões acerca dos modos como as “artes de combate” podem ser implicadas na forma como imaginamos futuros possíveis. Pensando num futuro crível, esta terceira edição terá como foco as “utopias” e os “futuros imaginados”. Com esta temática, pretendemos colocar a ideia e a conceção de utopia no centro do debate das ciências sociais, das artes e das humanidades, bem como é nosso intuito conferir relevo às metodologias fundadas nas arts-based research. As ameaças ao planeta - decorrentes das alterações climáticas, da extinção dos ecossistemas, da pandemia, das desigualdades sociais e das crises políticas e económicas implicam infalivelmente uma reconfiguração das práticas, dos modos de atuação e dos imaginários que permitam pensar futuros possíveis que vão além do modelo capitalista, extractivista, colonial e eurocêntrico. Deste modo, concetualizações acerca das utopias - das anti-utopias, das distopias, das distopias críticas e do antropoceno - são motores para avaliar novas relações entre os atores sociais, a natureza, as cidades, as artes, a cultura, o sistema económico e as tecnologias, contribuindo para possíveis transformações sociais e, subsequentemente, originando emergentes modos de a(r)tivismos.
A terceira conferência internacional COMbART: Art, activism and citizenship é o resultado de um consórcio constituído por diferentes entidades. A organização envolve o CICSNova da Universidade Nova de Lisboa, o Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e o Instituto de Sociologia da Universidade do Porto. São também parceiros deste evento a Rede Luso-Brasileira Todas as Artes (TAA) e a Rede de Pesquisa Luso-Brasileira em Artes e Intervenções Urbanas (RAIU). Pretende-se, assim, congregar um conjunto diversificado de saberes, de disciplinas e de artes, abrindo a apresentação de propostas a investigadores provenientes de áreas como a sociologia, a antropologia, a história, a história de arte, a economia cultural, a geografia cultural e social, o planeamento urbano, os estudos culturais, as ciências da comunicação e disciplinas correlatas, tais como design, ilustração, música, performance, cinema, artes visuais e performativas e novas tecnologias.
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